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O Primeiro Romântico

Empréstimo estraga a amizade

Universa

13/10/2017 08h00

 Dinheiro estraga a amizade, corrompe a amizade, prejudica a amizade. Nunca a relação de paz e cumplicidade será como antes se um amigo pede dinheiro emprestado. Pois a devolução interdita a confiança. Um telefonema ou um encontro arcará depois com a sombra monetária – esse corvo incansável – pairando sobre as cabeças. 

 

Mesmo com a lealdade de décadas, mesmo que seja um acordo entre pessoas generosas, mesmo que ambos estabeleçam datas certinhas de reposição, não há como inibir os danos emocionais. 

 

O dinheiro retira a pureza do convívio, amaldiçoa a espontaneidade das atitudes, macula o pensamento com segundas intenções. A naturalidade soará, em seguida, como oportunismo. As fronteiras entre a gratuidade e o interesse sumirão com o tempo. 

 

Quem cede não pode cobrar, quem recebe fica tenso para devolver e os prazos nunca se confirmam. O adiamento produz fofocas de uma parte e desculpas de outra. 

 

Não constranja o seu amigo solicitando um empréstimo. Ele não terá como negar. E se negar, devido ao orçamento apertado,  realmente se achará a mais avarenta das criaturas. A cumplicidade vai recuar para o terreno minado das insinuações. 

 

Todos têm gastos controlados com esposa ou marido ou pais ou filhos, qualquer saída de caixa acabará implicando mais gente e trará mais julgamento. Quem dá se enxergará obrigado a se explicar aos próximos o motivo da filantropia, porque tirou da receita e beneficiou alguém em detrimento dos demais. Os familiares pensarão que a situação anda cômoda, que vem sobrando recursos e passarão a exigir o dobro. O paraíso costuma ser vizinho do inferno das especulações. 

 

Aquele que pede dinheiro é insaciável, tampouco se contenta com uma única ajuda, não se basta com a exceção, consolidará o confidente como uma saída fácil e conhecida para fugir dos juros dos bancos e dos cartões de crédito. 

 

Amigo não é banco, amigo não é seguradora, amigo não é doleiro, amigo não é cambista, amigo é a simplicidade descompromissada. 

 

O amigo deve ajudar apenas permanecendo junto, retirando  conselhos e risadas dos bolsos. É arriscado assumir o papel de provedor e de pai das crises – o personagem não descolará do rosto. 

 

Amizade não pode sair da mentalidade da infância, da época sem salário e sem cobranças, em que o máximo que se emprestava era balas, chiclete, bolachinha recheada, o canudinho do refrigerante e a felicidade dos braços nos ombros. 

Sobre o autor

Fabrício Carpinejar é escritor e jornalista. Enquanto muitos se elegem como último romântico, ele se declara como o primeiro. Afinal, faz tempo que se prontificou a entender o amor em suas crônicas e poesias. Aqui você tem sua versão escrita, mas você pode conferir a sua versão falada em vídeos no YouTube: http://bit.ly/2sAu6xB

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